CACTOS EM EXTINÇÃO
Quase um terço dos cactos do
mundo sofre alguma ameaça de extinção, segundo artigo publicado hoje (5/10/2015)
na revista Nature Plants. A avaliação é resultado de um esforço internacional
liderado pela ecóloga mexicana Bárbara Goettsch, da União Internacional para a
Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês). “A partir de workshops e
grupos de trabalho que compilaram trabalhos publicados, além de nosso próprio
conhecimento, foi possível avaliar a situação de quase todas as espécies da
família das cactáceas que existem no mundo e todas as 260 espécies que ocorrem
no Brasil”, conta a botânica Daniela Zappi, do Jardim Botânico Real de Kew, na
Inglaterra. No mundo são 1.480 catalogadas, quase exclusivamente nas Américas –
uma única espécie ocorre naturalmente na Ásia e na África – e apenas duas não
foram incluídas no estudo por falta de dados. Além de Daniela, também
participaram da avaliação os botânicos brasileiros Marlon Machado, da
Universidade Estadual de Feira de Santana, na Bahia, e João Larocca, da Fundação
Gaia, no Rio Grande do Sul (veja na galeria de imagens:
http://revistapesquisa.fapesp.br/2015/10/05/cactos-ameacados/



Para quem cacto é sinônimo de
Caatinga, será uma surpresa descobrir que a maior ameaça a essas plantas reside
nos Pampas gaúchos. Lá existe uma diversidade de cactos pequenos,
principalmente dos gêneros Parodia e Frailea, como bolotas ou cilindros espinhudos
de flores vistosas. O fato de serem muito apreciadas por colecionadores é parte
do problema, junto com a pecuária, a agricultura e a mineração. Mais
recentemente as agressões se diversificaram, explica Larocca, com atividades
como a silvicultura em larga escala e a instalação de parques eólicos. “O uso
da paisagem torna mais frágeis populações que já eram pequenas”, resume.
O problema é justamente que esses
cactos se distribuem em pequenas áreas dispostas como as ilhas de um
arquipélago – uns aqui, outros ali. A distribuição dificulta a preservação, já
que não adianta fazer um grande parque nacional ou estadual. O botânico gaúcho
sugere a preservação por meio de Reservas Particulares do Patrimônio Natural
(RPPNs), em que proprietários de terra seriam estimulados a manter intactas
áreas onde há cactos. “Temos condições de desenvolver um projeto nessa direção,
que incluiria visitas técnicas às fazendas para orientar os proprietários, mas
não temos a verba para executá-lo”, lamenta Larocca. Ele ressalta que ações
nessa região teriam que ser coordenadas com países vizinhos, porque a flora de
cactáceas gaúchas tem mais semelhança com as da Argentina e do Uruguai do que
com a do resto do Brasil.
A interface entre o Cerrado do
centro-norte de Minas Gerais e a Caatinga, especialmente da Bahia, é onde está
a maior diversidade de cactos no Brasil. O estudo também destaca o México pela
riqueza, porém com uma proporção menor de espécies ameaçadas. Marlon Machado
destaca que a região se caracteriza por alto endemismo, com plantas que só
existem em um morro de pedra, ou no topo de uma montanha. Quando uma dessas
áreas se torna um foco de mineração, por exemplo, pode-se perder um tipo de
cacto. Na Bahia, ele também se preocupa com as espécies do Cerrado no oeste do
estado, uma vegetação pouco protegida no estado que se torna cada vez mais
rara. O problema está nos pequenos, coletados de forma indiscriminada para o
comércio de plantas ornamentais. “Espécies mais emblemáticas, como o mandacaru
e o xique-xique, são abundantes e não correm riscos.”
Daniela Zappi ressalta a ameaça
da mineração. “Muitas das Cactaceae endêmicas do leste do Brasil ocorrem em
substrato extremamente específico. Por exemplo, Arthrocereus glaziovii é
endêmica de Minas Gerais e ocorre diretamente sobre canga”, explica, se
referindo ao substrato rochoso rico em ferro. “Essa espécie era outrora comum
nas imediações de Belo Horizonte, e agora se encontra ameaçada.” Segundo ela,
uma grande variedade de cactos vive em substratos valiosos em termos de minério
ou mesmo de pedras ornamentais.
Os pesquisadores destacam a
necessidade de levantamentos abrangentes da flora para pensar em conservação,
mas sem esquecer que as plantas são parte de uma rede ecológica. “Considerando
que todas as cactáceas existentes são polinizadas por animais e muitas delas
dependem de vertebrados para dispersão, conhecimento sobre os polinizadores e
dispersores é vital para a proteção efetiva das populações”, ressalta Daniela.
Iniciativas como a capitaneada
por Bárbara Goettsch são empreendimentos trabalhosos que envolvem dezenas de
pesquisadores trabalhando em consonância. E são necessários, segundo a
pesquisadora da IUCN. “Se queremos comparar grupos de plantas diferentes,
deveríamos manter a metodologia que usamos para avaliar o risco de extinção de
forma coerente”, afirma.
Fonte: Pesquisa FAPESP
Artigo científico
GOETTSCH, B, et al. High proportion of cactus
species threatened with extinction. Nature Plants, artigo 15142, 5 out
2015.
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